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8, outubro 2015

Fundo de Garantia para os domésticos já está valendo

Começou neste mês  a obrigatoriedade de recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para as domésticas. Com isso, o patrão passará a pagar mensalmente 8% sobre o salário da empregada.

Começou neste mês a obrigatoriedade de recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para as domésticas. Com isso, o patrão passará a pagar mensalmente 8% sobre o salário da empregada. Deverá recolher ainda 0,8% a título de seguro contra acidentes de trabalho e 3,2% para formar um fundo a ser usado em caso de demissão sem justa causa. Já a contribuição ao INSS, que para o empregador correspondia a 12% do salário da trabalhadora, foi reduzida para 8% (veja quadros abaixo).

As novidades estão previstas na Lei Complementar 150/2015, que regulamentou direitos firmados na Emenda Constitucional 72/2013. A lei criou também o Simples doméstico, um sistema que unifica todos os pagamentos devidos pelos empregadores. Tudo será recolhido num boleto único preenchido pela internet, com data de vencimento no dia 7 de cada mês (leia abaixo o texto sobre a internet).

Com o Simples, foi criado o Programa de Recuperação Previdenciária dos Empregadores domésticos, que deu ao empregador a chance de parcelar débitos com o INSS com vencimento até 30 de abril de 2013. O parcelamento abrangeu até débitos já inscritos na dívida ativa.

Vantagens

Existem hoje no Brasil pouco mais de 6 milhões de pessoas executando serviços domésticos, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego.

A cearense Maria Aureni de Souza, 35 anos, faz parte desse exército. Trabalhando há três anos para uma família de classe média em águas Claras, cidade-satélite de Brasília, ela diz ter feito a opção certa ao ter deixado de ser diarista para virar empregada doméstica, mesmo ganhando menos.

— Como diarista, recebia melhor, em compensação não tinha férias remuneradas, nem 13º, nem recolhimento de INSS. Além disso, no fim do ano, muitos dos meus clientes viajavam e me dispensavam. Eu ficava sem trabalho e sem dinheiro — explica a profissional, que ganha R$ 1.100 líquidos por mês.

Se estivesse atuando como diarista na mesma região, poderia cobrar de R$ 100 a R$ 150, conforme o tamanho da residência. Aureni foi beneficiada pela Emenda Constitucional 72, promulgada em 2013, e que garantiu vários direitos que sempre foram negados a quem prestava serviços em casas de família. Agora, vai ser amparada com as inovações trazidas pela Lei Complementar 150/2105.

Horas extras

Seguro-desemprego, hora extra e adicional noturno igualmente também passam a contar com regras bem definidas. A lei complementar determina que todos os trabalhadores domésticos têm direito a receber a mais quando trabalham das 22h às 5h. Para o cálculo, a hora noturna equivale a 52 minutos e 30 segundos e deve valer, no mínimo, 20% a mais que a hora diurna.

Quanto às horas extraordinárias, o patrão deve pagar em dinheiro as 40 primeiras do mês. As demais podem ser pagas ou acumuladas num banco, para permitir a negociação de folgas.

Já o seguro-desemprego deve ser o equivalente a um salário mínimo, pago pelo governo por no máximo três meses. O beneficiado deve seguir as regras previstas na Resolução 754/2015, do Conselho deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat). Para pedir o seguro pela primeira vez, por exemplo, é preciso comprovar 15 meses de trabalho nos dois anos anteriores à solicitação.

Lei ampla

A nova legislação proíbe o trabalho doméstico para menores de 18 anos e define o empregado doméstico como aquele que presta serviços de “forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de dois dias por semana”.

— Vale dizer que a lei abrange também babás, motoristas, caseiros, cuidadores e até jardineiros, se estes não forem prestadores de serviço — explica o consultor do Senado Eduardo Modena, que lembra que a lei não vale para diaristas, considerados profissionais autônomos. Além disso, esclarece, a norma não retroage.

Também foram fixadas a jornada de trabalho em 8 horas diárias e 44 semanais e a remuneração da hora extra de, no mínimo, 50% superior ao valor da hora normal. Há ainda regras relativas à jornada parcial, que não pode passar de 25 horas semanais, ao período de descanso para almoço e às férias.

Internet será ferramenta fundamental

Toda a manutenção dos direitos e deveres de patrões e empregados domésticos passa a ser feita pelo portal eSocial (www.esocial.gov. br). Desenvolvida pelos então Ministérios do Trabalho e da Previdência, com a Caixa Econômica Federal, a Receita Federal e o INSS, a página já está no ar.

Em primeiro lugar, o empregador deve se identificar, com informações como CPF e recibos das duas últimas declarações do Imposto de Renda. Feito o cadastro, receberá um código de acesso ao portal para inserir dados do funcionário, como data de admissão, valor do salário, jornada de trabalho e número do NIT-PIS-Pasep.

Só depois disso será possível gerar a guia única de arrecadação de todos os encargos. O empregador deve entrar todos os meses no site e imprimir a guia.

O prazo para pagamento é o dia 7 do mês seguinte ao da competência. Os encargos de outubro, por exemplo, incluindo o FGTS, poderiam ser quitados sem multa até 7 de novembro. Mas como a data cai em um sábado, o recolhimento deve ser feito na sexta-feira, dia 6. Isso porque, sempre que o prazo-limite for no final de semana ou em um feriado, o pagamento sem multa deve ser antecipado para o dia útil anterior.

No caso do encargo de setembro, que vence nesta quarta-feira (7), o pagamento deve ser feito pelo sistema antigo, ainda sem a obrigatoriedade do FGTS.

No portal, o empregador deverá também registrar eventos como acidentes de trabalho e férias. é possível ainda imprimir modelos de folha de ponto e de controle de horas extras, entre outros.

Para tirar dúvidas, trabalhadores e empregados poderão recorrer ao Alô Trabalho, pelo número 158, e à cartilha Trabalhador Doméstico — direitos e deveres (veja saiba mais) .

— Todo o procedimento não dispensa a tradicional carteira de trabalho, que precisa continuar sendo anotada normalmente pelo patrão — alerta o consultor do Senado Eduardo Modena, que acredita ser possível para o empregador manter as obrigações em dia sem recorrer a um contador.

Senadores dizem que lei é boa para todos

Para os senadores que atuaram diretamente na aprovação dos novos direitos, o país está finalmente restaurando uma dívida com uma categoria de profissionais que sempre foi marginalizada.

Constituinte em 1988, Paulo Paim (PT-RS) lembrou que, na elaboração da atual Constituição, tentou incluir mais direitos para a classe, mas não houve jeito.

— A pressão do Centrão [bloco suprapartidário de orientação conservadora] não permitiu e poucos benefícios foram incluídos. Além do preconceito, pesou a questão econômica. Como o Centrão na época coordenava essa linha de não deixar ampliar os direitos dos trabalhadores, eles não queriam que os domésticos também tivessem todos os direitos — explicou.

O senador disse considerar uma bobagem o temor de que as novas obrigações patronais gerem um desemprego em massa no setor.

— Quando ampliamos a licença-maternidade também disseram isso. O mesmo aconteceu há muito tempo, quando houve a redução da jornada de trabalho de 48 para 44 horas semanais — lembrou.

Para ele, todos que precisam do trabalho doméstico vão mantê-lo e ainda terão um conforto legal, pois saberão exatamente quais são seus deveres e direitos.

Comissão especial

Para que os novos direitos pudessem valer, foi percorrido um longo caminho. Depois que a Proposta de Emenda à Constituição 66/2012 (a chamada PEC das domésticas) foi promulgada, tornando-se a Emenda Constitucional 72/2013, alguns direitos ainda ficaram pendentes de regulamentação. Uma comissão especial, formada por deputados e senadores, dedicou-se ao assunto.

O grupo foi criado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, e pelo então presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves.

A relatoria ficou a cargo de Romero Jucá (PMDB-RR), que desde o início dos trabalhos mostrou-se preocupado com a elaboração de um sistema que eliminasse a burocracia e permitisse simplificar a vida de patrões e empregados. A multa de 40% do Fundo de Garantia também era um problema.

— Um encargo de 40% de multa compromete o orçamento familiar. Uma empresa faz previsão contábil, tem lucro e já pode se preparar para arcar com essa multa. A família não faz isso. Em geral, conta na ponta do lápis para não entrar no cheque especial no fim do mês. é algo extremamente pesado — disse.

Para o senador, a lei é uma “proposta do bem”, com a qual todos saem ganhando.

— Nós estamos pacificando a relação da dona de casa com a empregada, no que diz respeito a preceitos legais, trabalhistas e previdenciários — avaliou.

Na opinião do presidente e fundador do Sindicato dos Trabalhadores domésticos do distrito Federal e das Cidades do Entorno, Antônio Ferreira Barros, os novos direitos chegaram tarde, mas podem ser comemorados.

Ele acredita que os patrões não terão mais coragem de ignorar os direitos dos funcionários, os quais, por sua vez, não terão mais vergonha de dizer que são empregados domésticos.

— É uma conquista de décadas de luta. Finalmente o legislador reconheceu que o trabalhador doméstico é como qualquer outro e tem os mesmos direitos — afirmou.

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